sábado, 18 de maio de 2013

Juiz recolhe jovens e reduz criminalidade




Índice de furtos cai 87% em Fernandópolis, 
depois de decisão polêmica

Otávio Frabetti

Julho de 2005. O então recém-chegado juiz da infância e 
juventude de Fernandópolis (SP), Evandro Pelarin, 
hoje com 39 anos, recebe uma missão de alguns
 populares: conter o abuso desenfreado de menores
de idade que ficavam soltos nas ruas de madrugada 
consumindo bebidas alcoólicas. O juiz pediu ajuda à
 PM e realmente as reclamações batiam. Em um 
plantão numa madrugada de domingo, 50 a 60 
menores chegaram ao fórum com evidências de
 terem bebido, e alguns de terem usado entorpecentes. 
Logo após o fato, a polícia emite um estudo (parecer)
 alegando que a rua era um local perigoso para os
 jovens à noite. Era preciso proteger e prevenir 
esses jovens dos riscos noturnos. E Pelarin assim o fez.
 Recomendou prudência e cuidado aos pais para 
evitarem que seus filhos ficassem nas ruas sozinhos
 depois das 23 horas. Estava instituído o Toque de 
Recolher. Embora não faça escolha por nomenclaturas,
 Evandro prefere Toque de Acolher. Segundo ele, é isso
 que é feito. Acolher jovens em perigo e mandá-los em
 segurança para seus lares.
Violência
Apesar da diminuição de muitos atos infracionais 
crime cometido por menores), Pelarin se antecipa
 ao afirmar que a função do toque não é combater
o crime. Para ele, a diminuição é lógica; ao se retirar
 das ruas pessoas em potencial risco de cometerem
 um ato, as estatísticas diminuirão. E reitera. 
Sua função é proteger o menor.
Trabalho
Essa é a palavra chave para entender o pensamento
 do juiz Evandro. Repetida várias vezes durante a 
entrevista, o juiz parece tratar o toque com 
muito carinho, como se fosse uma mãe mostrando
 o quarto arrumado do filho que regressa após 
tempos fora de casa. Ele frisa que o trabalho não
 é fácil, e nem perfeito, mas a diferença é que
 ele abraçou a causa e trabalha para valer. 
Quando o acusam de ser um homem midiático, 
o que segundo ele acontece sempre, Pelarin 
responde que quando houver mais atitudes similares
 à dele em outras localidades, a medida 
deixará de ser novidade. Para ele, o trabalho
 começou, está no meio, e poderá nunca ter fim.
 Não à toa, usa uma frase de Barack Obama, 
que parece ser seu lema. “Ao invés de combater
 nosso esforço, junte-se a nós”.
O juiz
O juiz é um homem muito respeitado e benquisto na cidade. 
Com uma linha pop (mantém contas no Twitter e no Facebook) 
conversa com jovens a respeito da medida e sempre
 quando há shows na cidade é perguntado se menores 
poderão ir sozinhos. A resposta é bem divertida: “se 
estiver acompanhado do papai e da mamãe, sem problema”
. [É permitida a permanência com outros responsáveis, 
avós e tios]. A única exceção é a Expo Fernandópolis, 
tradicional festa da cidade, quando o toque deixa de 
ser cumprido até o término dos shows. No resto,
 não tem choro. Ou está acompanhado de responsáveis, 
ou fica em casa. Sozinho não. Os dois filhos do juiz, 
de 2 e 4 anos, também terão que se acostumar quando 
chegarem à adolescência. O pai acha que terão problema 
para se adequarem. Mas, terão que seguir a lei.

Apoio
“Quanto ao apoio, não somos hipócritas. Queremos sempre
 apoio. Mas não é nosso objetivo. Trabalhamos para cumprir
 a lei. Ficamos envaidecidos, mas também recebemos críticas
 pesadas, até caluniosas, e se fôssemos pesar os elogios e as 
críticas, entraríamos em uma crise existencial psicológica. 
Estamos aqui para trabalhar. Se a sociedade bate palma,
 ótimo. Se não bate, nós vamos continuar a trabalhar. 
Não tem saída”. Assim, Pelarin define o apoio dos pais, 
que na maioria das vezes, vão assustados ao conselho 
tutelar saber dos filhos.

Quem não gosta
“Estamos em um país de críticos. As pessoas mal leem, 
não sabem como funciona nosso trabalho, não conhecem as
 leis e mal querem conhecer e já se acham doutores 
para criticarem”. É essa sua resposta para críticos que 
consideram sua medida totalitária e que infringe o
 direito de ir e vir, assegurado pela constituição.
 Ao que ele responde: “Ninguém tem liberdade absoluta. 
Eu não posso entrar no banco agora (16h30).
 Não posso pegar meu carro e parar em qualquer lugar.
 Os menores são submetidos ao poder dos pais.
 Eles não têm condições para decisões complexas
 da vida. Não podemos deixar que um menino de
 10,11 anos faça escolhas duas horas da manhã na rua”. 
Ele explana que não é ele quem faz restrições e
 sim a própria lei. E demonstra essas restrições 
apelando para um exemplo extremo: “Imagine uma 
criança de 11 anos que queira ir sozinha à Votuporanga 
(30 km de Fernandópolis) para ver a vó e o vô. 
Ela não pode. A lei impede o amor de avós e netos? Claro que não.”














E assim o jovem juiz vai trabalhando, seguindo as leis,
 cumprindo as regras e se mantendo forte com seu toque, 
que não é uma novidade no Brasil (há atitude 
semelhante em 72 cidades brasileiras espalhadas 
por São Paulo, Bahia, Minas Gerais, Mato Grosso do Sul, 
Paraná e mais 14 outros estados) e muito menos no
 Mundo (Grande parte dos Estados Unidos possui 
restrições similares).






Respeito marca atuação das operações antirrisco de menores
As operações são sempre aos finais de semana, sem dia definido, 
em uma média de três operações mensais. A PM age em 
companhia de conselheiros tutelares. O tratamento é respeitoso
 aos jovens em situação de risco. Dr. Evandro espera compor 
um quadro de voluntários para aumentar a frequência das 
blitzes e desonerar a polícia, que não tem como função vigiar
 menores e sim manter a ordem pública. A fiscalização
 acontece perto de bares, casas noturnas e lugares com
 potencial de risco. O objetivo não é realizar uma 
“caça às bruxas”. A fiscalização é treinada para não
 levar estudantes uniformizados ou adolescentes
 saindo do cinema e voltando para casa. Apenas 
menores portando bebidas e entorpecentes,
 ou em situação de risco, que estão 
desacompanhados de seus responsáveis. 
Eles serão abordados, levados ao conselho 
tutelar ou à casa dos pais. Estes são advertidos 
na primeira vez, e podem receber multas de 3
 a 20 salários mínimos e perda ou suspensão 
do poder familiar se os filhos reincidirem. Pelarin 
salienta que o Código Civil impõe a guarda e a
 companhia das crianças aos pais.


Toque escolar e trabalho infantil são propostas válidas
Em Fernandópolis há também o toque escolar.  Dr. Evandro 
explica que todos têm direito à educação. Todavia, se 
pressupõe a frequência escolar.  Ou seja, a falta de 
responsabilidade escolar fere um direito do próprio 
indivíduo. Dessa maneira, um estudante encontrado
 nas ruas em horário escolar será imediatamente 
recolhido pela PM e devolvido à escola, local em 
que ele deve estar “por bem, ou por um modo 
mais incisivo”, de acordo com o magistrado. 
Quanto ao trabalho infantil, Dr. Evandro Pelarin
 também se posiciona contrariamente. 
Sua opinião é que há incongruências grandes
 na lei, já que quando um menor comete 
um ato infracional ele pode ser condenado
 a prestar serviços à comunidade como 
medida sócio-educativa. Se ele não cumprir, 
ser condenado a uma internação. “E o menor 
que não cometeu crime e quer trabalhar?”, 
questiona o juiz. Para Pelarin, é preciso 
acabar com a ideia de que o trabalho infantil 
é exploratório ou agressivo (como pensam o 
Ministério do Trabalho e o Ministério Público
 Estadual, nas palavras de Dr. Evandro); “nós 
tentamos mostrar o trabalho não como castigo, 
mas como prêmio. Se vai bem na escola,
 respeita professores, e quer trabalhar, é 
encaminhando ao mercado de trabalho 
com salário correto, sem ser um 
emprego insalubre, além de ser diurno”. 
Desde 2005,  mais de 2000 autorizações
 foram dadas para adolescentes trabalharem, 
embora muitos nem comecem e outros parem
 no meio do caminho. 


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